quinta-feira, 16 de agosto de 2012

A Caminho de Kalandula


Não provoca arrependimento algum, acordar cedo para conseguirmos fazer os 420km desde Luanda por terras desconhecidas, parte em terreno esburacado, outra em terreno picado, para lá chegar antes do sol se pôr.

Só o atrevimento em enfrentar as forças policiais, que fazem tudo para nos arrancar ‘gasosas’, são um verdadeiro acto de coragem. Como nos dizem os locais, é uma questão de adaptação. E com o hábito, de facto acabámos por ser nós a dar-lhes a volta com pouquíssimos míseros Kwansas, e apenas e unicamente quando nos pediam de forma directa. Sempre que procuravam subterfúgios para inventar uma infracção, nós insistíamos até ao fim, estóicos na nossa razão e vencemo-los pelo cansaço. Acabámos os dois a rir de tudo isto.

Chegámos a NDalatando e ficámos espantados com a vista deslumbrante de uma cidade rural, em que as casas térreas, feitas de tijolos artesanais, são todas da cor do pó, vermelhas, e recebem o sol da tarde, que espelham por toda a montanha que se ergue por cima das casas, criando uma cidade da mesma cor, cercada de árvores, a maior parte Palmeiras.

Fica uma imagem mágica à chegada, inexplicável.

Depois de uma visita de carro pela cidade, por umas casas da época colonial, encostámos o carro antes da rotunda com o busto da Rainha Jinga, a Rainha Africana, que queria ser considerada um Rei.

E quando pensávamos começar a comer, apareceu-nos uma criança na janela do carro a dizer-nos adeus. Pequenina, acenava, de cara triste e suja e olhando para a nossa comida, num gesto sem nenhuma palavra, possivelmente incapaz de as proferir, indicou-nos que tinha fome. Dividimos o lanche, e ficámos felizes por podermos contribuir para um sorriso de quem parecia nunca ter visto uma simples bola sem creme.

Estas são as coisas más de África, as mais difíceis de suportar e impossíveis de esquecer.

Prosseguimos pensativos até Cacuso.

A paisagem é uma loucura. É quando se tem a noção de que Angola é imensa. Varia entre o árido da savana, e a floresta tropical. Várias árvores fabulosamente diferentes. Nunca havíamos visto todas aquelas variedades. É indiscritível a magia destes locais. De repente um grupo de meninos, bem pequenos, saem da floresta e é quando reparamos numas casas dentro da floresta diferentes de todas as que havíamos visto até aqui. Junto ao rio as mães lavam mais roupa enquanto a já lavada, seca estendida nos arbustos, e do outro lado da estrada, duas senhoras sobem do rio, carregando à cabeça alguidares cheios de loiça luzidia, acabada de lavar.

Há de tudo em África, até uns meninos da floresta, nos fazem acreditar que vivemos um fim-de-semana num conto de fadas.

Ao passar por eles na estrada, levantámos as mãos a acenar-lhes e foram-nos retribuídos eufóricos acenos, uma grande algazarra e inúmeros sorrisos. Parece que não passa ali muita gente que os veja.

Brincam com as coisas mais simples. Serve uma roda de uma bicicleta e um pau para se divertirem numa tarde. Um sorriso gigante prova que há muito mais alegria numa brincadeira simples que num jogo de playstation, ou numa grande casa de bonecas.

Chegámos a Malanje, onde dormimos essa noite.

De manhã percebemos que alguém proactivamente nos tinha lavado o carro e aguardava uma pequena retribuição que agradeceu muito. Seguimos para as Quedas a cerca de 80 km dali apanhando um troço da estrada em obras. Tudo em Angola está em fase de recuperação.

Na estrada muita gente procura vender aos carros que passam comida ou utilidades. À nossa aproximação elevam-nos carnes, uma espécie de ratos da savana - os mangustos, cabras selvagens, fruta, legumes e carvão, que observamos enquanto passamos, é quase como diz o Pedro como quando passamos nas prateleiras do supermercado.

Chegámos e percebemos logo que, quando se diz que Angola tem paisagens de cortar a respiração, este é certamente um desses lugares.

Até ao ano em que eu nasci, 1975 na época colonial, eram conhecidas como as Quedas do Duque de Bragança. São agora chamadas de as Quedas de Kalandula.

O Rio Lucala, o mais importante afluente do rio Kwanza é o responsável por esta maravilha natural, as segundas maiores cascatas de África.

São uns impressionantes 410 metros de extensão de água a precipitar-se de uma altura de 105 metros. E em vez de um arco-íris, recebeu-nos com dois. Mas é melhor verem as imagens que partilho aqui convosco, para poderem confirmar o quão magníficas são estas quedas!

Vou tentar carregar igualmente um pequeno vídeo aqui, em breve.

Para já, sigam este link para um vídeo que encontrei no youtube: 
http://youtu.be/7NYAvZ1D6kE?hd=1

1 comentário:

  1. Deve estar a fazer 50 anos que o meu pai lá esteve, desde que me lembro de existir que conheço Kalandula, desde pequeno me perguntava se eu lá ia estar um dia. Agora já sei a resposta.

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Obrigada por não ter vergonha em se despir publicamente!